quando você começa a rabiscar no papel branco e o grafite escuro vai se fixando, sem machucar a folha, e vai cobrindo o que está ao alcance e deixando intacto o que não está e, se você estiver com o rosto bem perto, pode ver um rastro frágil de poeira brilhante dançando com a sua respiração e sentir o cheiro distante de minério impuro exalando do papel, se soltando da ponta do lápis, dos dedos, e nem é um cheiro bom ou ruim mas te faz sentir em casa.
Representar por meio de caracteres ou sinais gráficos.
Exprimir-se por escrito.
Copiar.
Compor ou redigir um trabalho literário ou científico.
Dirigir carta a alguém.
Cartear-se, corresponder-se.
Fixar, gravar.
Descrever.
Alistar(-se), arrolar(-se), inscrever(-se).
Andar em curvas ou ziguezagues.
E. com luva branca: escrever com delicadeza, sem dirigir insinuações malévolas, sem ofender. E. letras: fazer letras. E. na areia: fazer coisa que não dura.
escrever já esteve mais próximo ao desenho. era tão mais próximo que, por vezes, a urgência de um se confundia com a do outro. e o gesto e o cheiro de papel e o afeto e as pequenas mortes.
à noite, na cama, no amarelado da quase penumbra, com o lápis na mão, com a folha encostando no rosto, ainda as confundo. é a melhor hora do dia.
“Escrever é também não falar. É calar-se. É gritar sem fazer ruído.”
Marguerite Duras, Écrire (Paris, Gallimard, 1993, p. 34)
Clarice falando sobre escrever. Parte 2 da entrevista para Tv Cultura, 1977